sábado, 10 de novembro de 2012

PEÇA TEATRAL “HAIR – DEIXE O SOL ENTRAR” – APRESENTAÇÃO DE 10/11/2012


Toda vez que vou ao teatro, admito que sinto uma pontada mista de saudosismo e inveja. Fiz teatro amador por muitos anos, atuei em algumas produções escolares em personagens tão diversos (até um peru de Natal eu fui), mas estou longe das artes cênicas desde 2009, quando fiz minha última oficina de teatro, no Centro Educacional Leonardo da Vinci, aqui em Brasília. Desde então, me afundei em outras coisas e deixei o teatro de lado. Entretanto, neste ano de 2012, com a mobilidade que os horários flexíveis das minhas aulas da UnB me permitem, e com uma maior independência de ir e vir pela cidade (por enquanto, de ônibus, mas em breve, de carro), pude voltar a esse universo tão diverso e tão gostoso. E como é bom!...
Hoje tive a oportunidade de assistir à montagem acadêmica do musical norte-americano “Hair – Deixe o Sol Entrar”, produzida pela Actus Produções e Entretenimento, no Teatro Nacional Cláudio Santoro, Sala Villa-Lobos. Ao chegar ao teatro, me deparei com filas quilométricas e desoladoras – até eu descobrir que todo aquele furdúncio era culpa de um espetáculo de dança produzido pela Academia Claude Debussy, que fazia a venda de seus ingressos hoje, e apenas hoje. Cheguei por volta das 14h e só consegui meu ingresso do “Hair” por volta das 15h30, mas encontrei um amigo, Henrique, que estava na fila desde 12h e ainda não conseguira comprar seu ingresso. Enfim, com o ingresso comprado, fui esperara abrirem a sala. Sentei-me no gargarejo: fileira A. Antes do palco, perto da minha fileira, havia umas almofadas, colchões e pufes espalhados. Antes do início da peça, alguns atores selecionam pessoas da plateia para sentar-se ali e curtir o espetáculo bem de perto. Não fui selecionado para esse privilégio, mas me realizaria bem mais tarde...
Após as tradicionais diminuições de luz do teatro, a banda responsável por executar as músicas entrou e ocupou seus lugares. Até então, já havia alguns atores pelo cenário – que incluía um enorme painel colorido e psicodélico pintado à mão – e já caminhavam ou apenas relaxavam e meditavam. A temática hippie trazida por “Hair” é um dos elementos mais especiais da peça, uma vez que transmite uma tranquilidade e uma paz indelével. Ao barulho dos guizos, começa a peça de fato, com a música “Aquarius”. Aliás, vale ressaltar que as músicas foram traduzidas para o português, e muitas das versões ficaram tão belas e eloquentes quanto às letras originais em inglês. Para começar, uma grata surpresa: Dionne, a personagem negra que abre o espetáculo, interpretada por Carol Araújo ou Isabelle Luz (como não conhecia os atores, e cada personagem tem dois atores os interpretado, ficou difícil saber quem era quem), tem uma voz absurdamente encantadora. Fiquei maravilhado com o timbre dela – me lembrou muito N’dea Davenport, vocalista do The Brand New Heavies.
A história de ”Hair” tem várias pontas: Claude, o jovem rebelde convocado para a Guerra do Vietnã, mas está em dúvida entre cumprir seu dever cívico ou lutar contra o sistema junto de seus amigos da tribo hippie; um jovem, inominado, que acaba de chegar à tribo e começa a aprender o verdadeiro valor das coisas; Berger, o pervertido galanteador que só quer saber de sexo e naturismo (ele chega a ficar apenas de tanga de palha no palco); Sheila, a universitária que é amiga dos hippies e organiza protestos em prol das causas deles, mas não comenta isso com seus colegas da New York University (ah, é: sim, a peça se passa num acampamento hippie nas redondezas de Nova York.); Jeannie, a jovem grávida que passa o tempo todo drogada, sob efeito de LSD – e protagoniza muitas das cenas mais engraçadas da peça (Gabriela Abreu ou Maísa Lacerda, seja quem estivesse encarnando a Jeannie na sessão das 16h30, estava excepcionalmente hilária); Crissy, a jovem sonhadora que não consegue achar a felicidade; Woof, jovem hippie, que diz não ser gay, mas também afirma que transaria com Mick Jagger, vocalista dos Rolling Stones; e muitos outros personagens incríveis e excelentes.
Como era a primeira sessão apresentada ao grande público (excetuando a performance realizada no festival Jogo de Cena, realizado no último Halloween, no Teatro da Caixa), era certo que aparecessem problemas técnicos. Microfones funcionando mal; vozes confusas em algumas partes de coro, dificultando até entender os solistas; alguns atores um pouco desafinados (cito apenas a personagem Sheila, que teve alguns momentos em que a voz sumia); e alguns problemas de iluminação (pelo menos, em três ocasiões, alguns atores fazendo solos ou cantando com outros solistas não foram focalizados pelos refletores para que o público soubesse quem estava, de fato, cantando aquela parte). Claro que, nas próximas sessões, esse problemas deverão ser resolvidos, mas é interessante ver que, mesmo assim, tais ocorridos não atrapalharam o andamento do espetáculo.
Creio que a quebra da quarta parede é o ponto mais interessante e envolvente da peça. Como disse Élia Cavalcante, diretora geral e cênica da peça e fundadora da Actus, no minidocumentário sobre os bastidores da peça, exibido durante o intervalo de 15 minutos entre um ato e outro, “o público acaba se tornando a tribo também”. É exatamente isso – o público é cativado pela temática e pela interação dos atores com ele. Por diversas vezes, atores entravam dançando e cantando pelas escadarias do teatro, a caminho do palco, e interagindo com os espectadores, e isso é excelente para atrair a atenção para o palco, para a história, para a mensagem trazida. É essa mensagem – de paz, de amor, de liberdade, de poder de escolha – que é passada.
Ao final da peça, com a performance de “Let The Sunshine In” – mais uma vez com a excelente cantora que interpreta a Dionne – os atores quebram de vez a quarta parede teatral e puxam espectadores para cima do palco, a fim de entoar os versos do refrão: “deixe o sol vir/ deixe o sol entrar/ o sol entrar”. Qual não seria a minha surpresa quando a personagem Crissy (Ana Laterza e Débora Luize) me puxou da primeira fila e me levou para o palco. Uma vez ali, cantando junto dos atores e dos outros espectadores convidados, pude cumprimentar o motivo de eu ter ido assistir à peça – Lílian Sampaio, que, apesar de não sermos próximos, tenho respeito e admiração por ela desde o tempo em que estudávamos juntos no Leonardo da Vinci, e quando a vi como a vilã de “Rapsódia na Vila do Ooh”, no ano passado, ao lado de Anna Salles.
Também pude entender ali, em cima do palco principal da Sala Villa-Lobos, no Teatro Nacional de Brasília, que, apesar de eu estudar e gostar de Ciência Política, de escrever livros e crônicas, eu sempre terei um pé no palco. E, mesmo longe, o teatro não sai de mim, porque eu posso ser quem eu quiser em cima do palco. Ser o Caio César todo dia é um saco, às vezes. Mas, no palco, eu posso ser um peru de Natal; posso ser José, pai de Jesus; posso ser Caio Lacaio, o mensageiro da princesa Branca de Neve; posso até ser Dom Pedro II, como fui numa peça sobre as leis abolicionistas do Brasil. Mesmo longe, eu estou sempre perto do teatro – ele está dentro de mim, bem como a música, a dança, o cinema, as artes plásticas, e todas as belas artes...

2 comentários:

  1. Gabriel11:38 AM

    A Dionne da sessão que você assistiu foi a Isabelle Luz

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