Como muitos já sabem – se não souberem, é só ler o último post do blog -, o Projeto Víbora está suspenso até novembro. Com isso, me sobrou mais tempo para redigir a última parte do Especial Bat For Lashes, a resenha do disco “The Haunted Man”. Desde que comecei a escrever a coluna “Sílabas Poéticas” – e, no momento, é uma história mal-resolvida da qual não intenção alguma de comentar publicamente, peguei o disco, um aparelho de som, um caderno e uma caneta, e comecei a tomar nota de todo o contexto que o envolve – desde as letras e das batidas de cada música, passando pela ficha técnica e pela banda, até chegar ao encarte e nas mensagens cifradas por trás de cada som.
A partir disso, fiz um esquema em tópicos, que transformarei em um texto em prosa logo mais abaixo. Caso seja do interesse de vocês, posso postar os fac-símiles do meu esquema na página de Facebook do Música Na Vida – é só pedir nos comentários a esse post. Ah, e por favor, também comentem o que acharam da resenha – é muito importante para o sucesso do blog saber o que o público pensa do conteúdo, da forma e do contexto!
Além disso, já está no ar o primeiro podcast do Música Na Vida no nosso SoundCloud! Acesse e curta sucessos românticos de Sade, Sandy, Beeshop, Björk, entre outros! Bem, darei início ao texto logo, antes que vocês desistam e saiam da página antes de chegar no cerne deste post! Obrigado a todos pela audiência ao Especial Bat For Lashes, e em breve anunciarei novas séries por aqui! Fiquem de olho!
Abraços,
Abraços,
Caio César.
Não é
de agora que existe vanguarda no mundo da música. Desde Cole Porter e seus
primeiros musicais na Broadway, até Madonna e suas reinvenções a cada álbum, é
notável como ainda há tantas novidades a serem mostradas por meio da arte dos
sons. Apesar de saber disso, não canso de perder o fôlego a cada vez que vejo
algo completamente inovador surgir neste meio – e com Bat For Lashes, não
poderia ser diferente.
Natasha
Khan, a real identidade da Bat For Lashes, é uma compositora de riquíssimo
vocabulário e de voz inconfundível. Com seu rostinho angelical, consegue
mostrar faces tão díspares em sua arte, que vão desde a sofredora que perdeu
tudo à sedutora prostituta que esmorece homens e mulheres por onde passa. Seja
qual for a persona encarnada naquela música, Khan consegue convencer em todos
os papeis, além de encantar com sua voz de mezzo-soprano quem a escutar.
O álbum “The Haunted Man”, o
terceiro de sua carreira, carrega consigo uma forte carga de metamorfose para a
música da Bat For Lashes – não é o som comercial que dominou as paradas de
sucesso com “Two Suns”, nem é o indie underground que marcara “Fur and Gold”,
mas, sim, uma sonoridade mais adulta, mais esférica e sem arestas, que nos
cativa como um bálsamo. É o disco de afirmação da Bat For Lashes, e ela
consegue provar a que veio. Como se ainda precisasse provar...
Para
início de conversa, “Lilies”... A música que abre o disco mostra um pedido
desesperado por um sopro de vida, refletindo bem o estado de espírito de Khan,
recém-saída de uma turnê mundial e de um desgastante relacionamento amoroso, e
seu arranjo tem algo de onírico, embalado pelas batidas eletrônicas, levando a
uma claustrofobia musical. Em seguida, vem “All Your Gold”, que mostra a
fragilidade de um eu lírico feminino que acaba de ser deixada pelo homem que
tomou dela tudo que lhe pertencia, tudo que ela sabia de si mesma, e a
percussão nervosa e indignada realça ainda mais esse sentimento voraz que a
letra transmite, bem como o desenho que acompanha o encarte do disco, que
mostra alguém abandonado em uma ilha, desesperançoso quanto ao futuro e às
incertezas que o mar trará. Já em “Horses of the Sun”, terceira faixa do álbum,
Khan relembra como era bom vivenciar o amor, e a liberdade que este proporciona
quando se está em sintonia com o outro, mas a mensagem mais clara é que, ao
contrário de “Two Suns”, em que o arranjo de cordas era mais notável em quase
todas as faixas, é a batida percussiva que deixa sua marca registrada no disco.
“Oh
Yeah”, a faixa seguinte, traz um elemento-surpresa – um coral masculino – que deixa
ainda mais agradável seguir a jornada do eu lírico para retomar a rotina e
encontrar a luz, depois de muito tempo na escuridão, levando-me a interpretar
esta canção como uma metáfora
psicológica. Em seguida, “Laura”, a rainha de todos os homens, chega
como mais uma persona encarnada por Khan, cuja importância do prazer que ela
proporciona aos homens com quem se deita é tamanha, que todos têm seu nome
tatuado sob a pele, como forma de se lembrar dela eternamente, e aqui Khan
mostra todo o seu alcance vocal e o arranjo orquestral de uma forma simples e
despojada de exageros. Logo após, “Winter Fields” surge como um vento gélido e
cortante, e mostra como é instigante pensar nos segredos e nos perigos do
inverno, mas deixando claro o quão imprevisível podem ser estes segredos que
ele esconde.
A
música seguinte é a que intitula o álbum, “The Haunted Man”, e mostra,
inclusive no desenho que acompanha o encarte, um homem assombrado cuja marca do
macabro está cravado em seu peito, e ele deve aprender a lidar com seus próprios
fantasmas, se quiser ficar livre do que o atormenta – o coro masculino ao fundo
deixa ainda mais profunda essa descoberta do autoconhecimento, as vozes lembram
monges gregorianos, apesar de a batida lembrar a de uma banda de coreto, com
direito a balizas e acrobacias de cheerleaders. Logo após, vem “Marilyn”, e nos
mostra mais uma persona de Khan, que deixa claro que todas as mulheres do mundo
querem, pelo menos por um dia, ser Marilyn Monroe, a mulher inatingível que
seduz os homens e é a grande estrela do dia, mas sofre com suas próprias
fraquezas ao deitar a cabeça no travesseiro. Em seguida, vem “A Wall”, que
promove o retorno de Pearl, o alter-ego que Khan assumira em “Two Suns”, e nos
mostra como devemos nos guiar em direção ao otimismo, sem usarmos do ceticismo
para encontrar a saída, bem como superar frustrações e dores para se libertar
da gaiola.
Em “Rest
Your Head”, Khan encarna um papel maternal, uma heroína superpoderosa e
superprotetora que luta contra os monstros da psiquê, na tentativa de proteger
a cria dos perigos do mundo. Já na última faixa do disco, “Deep Sea Diver”, o
eu lírico finalmente alcança a sua redenção, é chegada a hora de se libertar de
vez daquele mundo onírico cheio de coisas boas e de coisas ruins – e a única
saída é o mar, onde deve-se mergulhar até encontrar a realidade. Apesar de
parecer uma completa loucura para quem vê de fora, quem assim busca a salvação
sabe que esta é interna, individual, e que só quem passa por tais percalços sabe
o quão libertária é esta redenção. Ao fazer um disco conceitual, que analisa a
solidão e o caminho da depressão à luz do fim do túnel, Khan mostra que seu
talento é inesgotável e que está apenas começando. E é justamente por isso que,
às vezes, seus versos rebuscados podem parecer forçados, mas não é bem assim –
idade nada tem a ver com maturidade, e Khan deixa isso bem claro ao se firmar
como uma compositora que sofre as dores que canta, e que sorri as alegrias que
escreve.
Uma
frase para resumir o pensamento: “I keep telling myself to just let go” (“Eu
insisto em dizer a mim mesma para seguir em frente”, em tradução livre).
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