sábado, 19 de novembro de 2016

Peça "Urgente" - Apresentação de 19/11/2016

O teatro contemporâneo, sobretudo quando trata em cena de situações quotidianas de forma quase não roteirizada, é um grande enigma ainda, para este jovem aprendiz das artes cênicas que vos escreve, porém o fascínio pela singeleza deste tipo de fazer cênico é suficiente para aplacar todas as dúvidas e deixar apenas a observação participante agir sobre a visão da cena. Em outras palavras: é confuso, é estranho, mas é viciante e prende fortemente a atenção do espectador nas ações que acontecem em cima do palco.

Créditos: Foco in Cena

Antes, porém, de falar das minhas impressões acerca da peça "Urgente", que prestigiei na data de hoje no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de Brasília, preciso desabafar a respeito das complicações de minha ida ao local supracitado... O sábado trouxe uma forte e torrencial chuva para a capital federal, como há muito eu não presenciava, e claro que a consequência mais óbvia disto foi o atravancamento do tráfego de veículos. É impressionante: é só chover que parece que as pessoas conduzindo seus automóveis se esquecem completamente como dirigir e parecem bêbados aparvalhados no meio da pista! Mesmo vencendo estes empecilhos, ainda precisava vencer dois graves problemas: apesar de plana, Brasília tem acessos subterrâneos para alguns bairros e, no caminho de minha casa até o CCBB, há dois mergulhões que passam por baixo de viadutos - e ambos estavam alagados. O primeiro, para mudar da pista L4 Sul para o acesso à Ponte Juscelino Kubitschek, até que foi tranquilo de se atravessar, ainda que eu tenha suado para fazer meu compacto carro de marcha completar o caminho; já o segundo, para sair da via de acesso à ponte para pegar o segundo trecho da mesma pista, que dá acesso ao CCBB, o mergulhão estava intransponível.

Créditos: Carol Thusek/ Agenda Cultural Rio de Janeiro

Até cogitei atravessar mas, quando vi um desses carros tipo SUV dando meia-volta na direção contrária, olhei para meu carrinho e percebi que era melhor não me arriscar. Com muito medo, peguei a pista na contramão e fiz meu caminho para retornar ao acesso da ponte JK. Assim, atravessei a ponte, fiz o retorno e a atravessei novamente para, então, pegar a saída alternativa da mesma pista que dá acesso ao meu local de destino. Cheguei em cima da hora para retirar meu ingresso e, uma vez que estava até com as meias dentro dos tênis encharcadas, me presenteei com uma xícara de chocolate quente.

Créditos: Raquel Carneiro/ Cena em Pauta

Prevista para começar às 20h, a peça só começou mesmo vinte minutos depois - e, dentro do auditório com capacidade para cerca de 300 pessoas, não deveria ter mais de cem presentes... Uma grande pena que a chuva tenha atrapalhado tudo, porque "Urgente" foi, sem dúvida, uma das mais intrigantes peças teatrais que eu já assisti. Com texto criado coletivamente pelos membros da companhia teatral Luna Lunera e do Areas Coletivo de Arte, e direção de Maria Silvia Siqueira Campos e Miwa Yanagizawa ("Trágica.3"), "Urgente" começa como já diz seu título: tão logo a plateia se acomoda nas poltronas, um ator já está cena, interagindo com o cenário e com a ambientação sonora. O ator em questão é Zé Walter Albinati, que interpreta uma espécie de faz-tudo do prédio em que se passa a história.

Créditos: Raquel Carneiro/ Dica de Teatro

Ali, há quatro apartamentos habitados por figuras que poderíamos encontrar em qualquer lugar: uma costureira solitária (Isabela Paes), que sonha em ser mãe, mas que está com a saúde debilitada; um carnavalesco (Cláudio Dias), igualmente solitário, e amargurado por ter sido renegado pelo pai ao assumir sua homossexualidade; e o administrador do condomínio (Marcelo Souza e Silva), que não sabe falar de outra coisa senão trabalho. Há um apartamento vago, que logo é ocupado por um jovem rapaz (Odilon Esteves), que tão logo chega já instaura diversas confusões com os outros moradores dali. São eles figuras comuns, com histórias comuns, mas cujos passado, presente e futuro se alinhavavam - ao longo da peça, entende-se que o jovem forasteiro tem um passado em comum com o carnavalesco, e que o faz-tudo tem uma história intrínseca com a costureira. Dessa forma, o suspense em torno destas tramas é o mote do roteiro.

Créditos: Carol Thusek/ Sopa Cultural

Além disso, há uma situação um tanto inusitada: o prédio possui um alarme de abalos sísmicos e, assim que este é acionado, um dos personagens devem comparecer ao foco de luz e contar, em aproximadamente dois minutos, a sua história de vida. Neste curto tempo, cada um fala as lembranças que a consciência do fim de suas vidas traz às suas mentes. Cada um tem histórias belíssimas e emocionantes, mas as histórias deixadas pela metade são agonizantes e deixam um retrogosto de incompletude.

Créditos: Carol Thusek/ Visit Rio

Sem dúvida, os grandes destaques de "Urgente" são Cláudio Dias, que interpreta uma figura controversa para os padrões moralistas da sociedade atemporalmente conservadora na qual a história está inserida, e Isabela Paes, que faz de sua costureira a personagem mais central da história, ainda que não haja, de fato, um protagonista nesta história. A cenografia também é um charme à parte - e tome cuidado com as moedas, caso sente nas primeiras fileiras! Definitivamente, um excelente espetáculo para este atrapalhado e chuvoso sábado, mas, mais do que isso, o perfeito exemplo de como é necessário vivermos a vida como se cada minuto fosse o último - faça valer a pena!

Créditos: YouTube

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